A Imigração Suíça de 1819
Em 1819, havia na Suíça mais gente do que terra, enquanto no Brasil havia bastante mais terra do que gente. Lá, o drama de uma grave crise provocada por dificuldades na agricultura, na indústria e no comércio. Aqui, a euforia de um mundo novo, ávido e tido como fantástico eldorado.
O nome do país, na época, era Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, com sede no Rio de Janeiro, de onde reinava, desde 1808, com toda a sua corte, Dom João VI. Em 1817, iniciou-se longa negociação diplomática visando à criação de uma colônia suíça no Brasil.
Acertadas e documentadas as condições do contrato entre os dois governos, Dom João VI autorizou a compra de uma área na região serrana, a cerca de 120 quilômetros do Rio de Janeiro, para instalação dos imigrantes. Foi escolhida a então chamada fazenda do Morro Queimado, que passou a chamar-se Nova Friburgo, em homenagem ao cantão suíço de Fribourg.
Inscreveram-se para a grande aventura 2.006 suíços, em sua grande maioria agricultores falantes de língua francesa. Eram originários dos cantões de Fribourg (830 deles), Berna (500), Valais (160), Argóvia (143), Lucerna (140), Solothurn (118), Vaud (90), Showyz (17), Neuchâtel (5) e Genebra (3). Do total, 57% eram crianças e jovens de até 19 anos; os demais tinham entre 20 e 60 anos.
Segundo o contrato, o governo de Dom João VI pagaria as despesas de viagem a partir do embarque na Holanda. Até lá, porém, os colonos deveriam viajar por conta própria ou com ajuda dos governantes de seus cantões de origem. Ficou estabelecido que todos se encontrariam na Basileia, localizada às margens do rio Reno. Era o início do verão europeu de 1819. Saindo do porto fluvial da Basileia, a bordo de pequenas embarcações, desceram o Reno, enfrentando sofrimentos de toda ordem, até a foz em Roterdã, na Holanda. De Roterdã foram levados para Dordrecht, onde permaneceram por várias semanas, sem a mínima assistência, à espera dos navios que os trariam para o Brasil. Finalmente, começou o embarque, em St-Gravendeel, partindo o primeiro navio no dia 11 de agosto de 1819.
Aquarela de Isaak Schouman, executada no próprio acampamento dos colonos suíços em Mijl, Holanda (1819). Acervo: Coleção Dordracum Illustratum, Arquivo Regional de Dordrecht.
Sete navios de pequeno porte, sem nenhum conforto, e todos eles com excesso de passageiros, fizeram a grande travessia: o Daphné, o Debby Elisa, o Urania, o Elisabeth Marie, o Heureux Voyage, o Deux Catherine e o Camillus. O primeiro a chegar ao Rio de Janeiro foi o Daphné, que fez a viagem em 55 dias; os últimos foram o Camillus e o Deux Caterine, que, por motivos diversos, demoraram, respectivamente, 122 e 146 dias para alcançar a baía da Guanabara. Ao que se sabe, foi uma viagem terrível, havendo registro de 311 mortos entre o porto de embarque e o de chegada.
A acolhida aos imigrantes no Rio de Janeiro, segundo os registros disponíveis, foi das mais simpáticas, fazendo-os quase esquecer as agruras até ali padecidas. O padre Jacques Joye, um dos principais líderes do grupo suíço, foi recebido pessoalmente pelo rei, que lhe apresentou as boas vindas e determinou que se enviasse aos colonos grande quantidade de laranjas, bananas, pão, vinho e aguardente.
A implantação da colônia helvética em Nova Friburgo estava a cargo do monsenhor Miranda, que já providenciara a construção de casas para os imigrantes na futura vila e agora se encarregaria de levá-los até lá.
Seriam mais de 20 léguas de heroica jornada. O primeiro trecho, na planície, foi feito quase todo a bordo de canoas, subindo o rio Macacu até as cachoeiras. Dali por diante, árdua caminhada serra acima, com auxílio de uma tropa de burros para o transporte de crianças e bagagens. O percurso desde o Rio de Janeiro durou cerca de duas semanas, terminando no dia 18 de fevereiro de 1820, quase um ano após a saída dos suíços de seus cantões. Somados os que morreram ainda na Europa, mais os que morreram no mar e os que morreram já no Brasil, registrou-se um total de 389 baixas, a par de 14 nascimentos. Assim, daqueles 2.006 que embarcaram na Basileia, chegaram à fazenda do Morro Queimado 1.631, os quais entrariam na história ao lançar, dois meses depois, no dia 17 de abril, a pedra fundamental da hoje encantadora cidade de Nova Friburgo.
FRÈRES, Rigo. Subida da Serra dos Órgãos. Litogravura, 11,6 x 16,3 cm. Acervo: Fundação Biblioteca Nacional do Brasil.
Fonte: Vida, Verso e Prosa - Blog/Livro Por: A. A. de Assis (Gutinho)
Fonte: Livro "A Gênese de Nova Friburgo." (1995) Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional. Por: NICOULIN, Martin